Vendas Novas em mim
Vera
Estação dos comboios, em Vendas Novas. Passagem... Gosto de comboios e, desde criança, que tenho por eles enorme fascínio. Não sei... os comboios são misteriosos. Aqueles tubos metálicos, aquelas rodas que chiam nos carris, alguns grafitados, mas...na minha imaginação, vejo-os percorrer montanhas, a atravessar o gelo cortante do vento, a vislumbrar paisagens verdejantes...grandes fumaradas nos apeadeiros distantes...entram e saem desconhecidos...passagem. Aqui, em Vendas Novas, todos estão de passagem. Outrora, boinas verdes enchiam as carruagens. Moços bonitos, fardados de soldados, cabelo bem cortado, expressão de rapazolas, olhar luminoso, uns apreensivos, outros brincalhões, vendo as raparigas passar, uns piropos, uns beijos fugazes, uns ficaram para sempre, outros foram para outro lugar. Vendas Novas...quem és tu? De quem és feita? Vieste, como transeunte, ousaste permanecer, aqui floresceste e plantaste as tuas raízes e viste novos rebentos despontarem do teu tronco. Ficaste e fizeste de uma terra de ninguém a terra que nos puxa, nos empurra e nos volta a agarrar. Vendas Novas...somos teus filhos. Por vezes, somos filhos adolescentes, rebeldes, revoltamo-nos contra ti, dizemos que estás utrapassada e nada fazes, já nada és, nada consegues, nada...queremos sair. Fugimos, de malas e bagagens, convictos de uma certeza própria e imberbe de que seremos bem sucedidos e já não precisamos de ti, somos independentes, mais evoluídos!... Vendas Novas...como uma mãe, que espera em silêncio, que vê os seus filhos tomarem asas e voar, ela espera. A maturidade chega, a saudade da família, dos amigos, daqueles que são feitos do mesmo sangue, que falam a mesma língua...deixa-me voltar, mãe, e abraço-te! O teu abraço é quente, aconchegante, seguro, és a minha terra, o meu destino, a minha casa. O combóio levou-me para longe, abracei tanta gente, dividi o meu amor em mil pedaços e dei-os a quem por mim passou mas mãe, Vendas Novas, para ti guardei as veias, o coração, a vida. Pertenço aqui.